sexta-feira, 15 de maio de 2015

Confissões: como tudo começou



A memória, apesar de fugaz, transporta-me para 1996. Acabo de completar 7 Primaveras. A minha irmã tem 5, idade definida pela minha mãe para obter o passaporte que nos permite transpor a Península Ibérica. Nunca tinha andado de avião. Estou no aeroporto de Sá Carneiro, com um nervoso miudinho a olhar para as escadas do avião. Os meus pais dão-me confiança para avançar. Chego ao topo das escadas e ao colocar o pé (direito, para dar sorte) no seu interior faço um apontamento mental para nunca mais me esquecer daquele momento. Nunca mais esqueci.



Em Agosto desse ano, os meus pais decidiram que estava na altura de fazerem a experiência: duas semanas em Paris com as filhas. Se tudo corresse pelo melhor outras viagens se seguiriam. E seguiram. E seguirão. 
Foi em família que fui ensinada a viajar. Mais propriamente, a quatro. Mas já viajei sozinha, com amigos e a dois. E continuo a viajar. Agora viajamos a cinco (adição recente do Tiago à família) e tem um gosto especial.



Paris foi a primeira. Aquela que com apenas 7 anos me abriu os olhos para o mundo. Há sempre uma viagem que nos “bate”, a nós viajantes incautos, e nos cria uma fome insaciável de viajar. Paris foi a primeira. E a tal.
Somos uma família de classe média. Em 1996 a conversão escudo franco era um péssimo negócio. Assim o nosso poder de compra era limitado. Dez dias em Paris exigem um orçamento elevado. Para contornar essa situação, por intermédio de um familiar, que é missionário, pedimos alojamento num seminário. Por um valor simbólico, temos hospedagem e refeições.



Nós chamávamos ao seminário, “os padres”, com a generalidade despreocupada de crianças. E quando penso neles o aroma do chá de limão invade-me a memória. A minha irmã sempre foi mais encantadora do que eu, o que fascinou rapidamente o diretor do seminário. Para nós era o “padre velhinho”. O seu rosto, há muito abandonou as minhas memórias. Mas não o do seminarista português, de cabelos negros e sorriso doce, pelo qual sofri uma enorme paixoneta.



Sempre fui curiosa, bastante mais do que o recomendado. O que causou bastantes inquietações aos meus pais. Perdia-me facilmente em qualquer lado, se o que estava a ver me interessasse o suficiente para me abstrair de tudo o resto. Em Paris é tudo novo. Ando com os olhos bem abertos, a tentar absorver tudo o que a minha memória de menina de tenra idade me permite.



Um dia acordo e não encontro os meus pais. Os meus tios também saíram. E a minha prima, adolescente, ficou responsável por nós e pelo irmão. Explica que os adultos saíram, foram visitar o Louvre. Aguardo o regresso dos meus pais, com toda a indignação que me cabe no peito. Choro compulsivamente quando chegam, porque também queria ter ido ao Louvre e agora eles conheciam a Mona Lisa e eu não. Não sabia quem era a senhora, mas tinha ouvido o nome em conversas e diziam que era uma mulher muito bonita. Quando a conheci, um par de anos mais tarde, que não foram mais do que dois, separada por hordas de japoneses, não poderia ter ficado mais desiludida. No entanto, ainda hoje mantenho a firme opinião que deveria ter sido consultada em relação ao assunto!




Cresci com as personagens Disney. As cassetes da Branca de neve ou do Bambi encontravam-se sempre perto da televisão. Prontas para serem colocadas no leitor, mal regressássemos da escola. Dois dias inteiros são reservados para a exploração do parque, então chamado Eurodisney. A excitação que precede a noite anterior à visita é tal que tanto eu como a minha irmã pouco dormimos. E somos as primeiras a abandonar a cama.



Outro momento que fica gravado depois de muitos anos passados: transpor as cancelas metálicas do parque pela primeira vez. Fico perdida e extasiada com o que me rodeia. Oiço uma melodia doce, de fundo, e os gritos nervosos da montanha russa começam a causar-me arrepios. Não consigo decidir por onde começar. O meu primo resolve o problema quando me empurra, entre risadas, para o labirinto da Alice no país das maravilhas. No final do dia, e isto conta-me o meu pai, porque não me recordo, vou estendida a dormir no chão do metro (RER), vencida pelo cansaço, de sorriso no rosto.



As emoções sentidas nestes dias são difíceis de descrever. São dias com sentimentos fortes, de busca e descoberta. De passeios em museus e monumentos, de aprendizagem constante e brincadeiras pelos jardins da cidade.



O leitor poder-se-á questionar porquê Paris. Paris tem afeições associadas mesmo antes da viagem. Todas as crianças se deleitam a ouvir a poética história de como os pais se conheceram. Principalmente aquelas que assistem diariamente a contos de fadas. Paris foi o local em que os meus pais se apaixonaram. E foi esse o local que quiseram mostrar primeiro às filhas.


2 comentários:

  1. Que post mais fofo!! Com esta viagem os vossos pais, mais do que vos darem um presente, deram-vos o mundo e a vontade de partir à sua descoberta...

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    1. Olá Marta! Sim, enraizaram desde muito cedo a nossa vontade de viajar. Esta foi a primeira, mas todos os anos fazíamos uma grande viagem (primeiro road trips na Europa, para depois descobrirmos juntos outros continentes). A verdade é que passados tantos anos ainda viajamos juntos: no final deste ano iremos um mês em família (a 5) para a Ásia ;)

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