quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Tikal, o mundo perdido



É um lugar mágico, senti-o no momento em que entrei no parque nacional. Embrenhado em 22 mil hectares de floresta densa e dotado de uma enorme biodiversidade, os únicos ruídos audíveis são os dos seus habitantes. De raros felinos a crocodilos, de tucanos coloridos a serpentes, é possível observar diversos animais exóticos, ao longo dos caminhos da cidade.


Contudo, os principais contribuidores para a melodia da selva são os macacos "gritadores". Estes produzem um som assombroso, que deu voz aos assustadores tiranossauros rex no filme Jurassic Park, e fazem-nos  irracionalmente temer que as descomunais criaturas saltem da floresta a cada instante.


Yaax Mut Aal, nome original da cidade, esteve perdida durante séculos, provavelmente desde o seu colapso em 900d.c.. Só em 1848 é que foi visitada pelos primeiros exploradores que a encontraram, literalmente, engolida pela selva. Mesmo atualmente, as  centenas de pequenos montes de terra e vegetação que se observam não são mais do que os antigos edifícios maias.


Tikal deveria ser uma das 7 maravilhas do mundo. Não só pela imponência, ou pela selva magnífica que a rodeia, mas pela sua grandiosidade. A NASA, num estudo realizado, detetou mais de 18000 edifícios no local, 3500 dos quais dentro das muralhas da cidade. Destes, fazem parte e podem ser exploradas, pequenas casas, palácios reais com dezenas de divisões, templos majestosos, enormes campos de jogos, inúmeras praças pavimentadas e até embaixadas, como a da vizinha Chichén Itzá, constituindo assim um dos principais centros do mundo maia.


Os templos do I ao IV são provavelmente os edifícios mais conhecidos. O primeiro é o mais importante, porque foi onde se descobriu o túmulo do governante número 26, apelidado de Sr.Chocolate, um homem de 1,90m, que foi encontrado ornamentado com 8kg de jade. Para os padrões de altura dos maias, 1,60m para os homens e 1,50m para as mulheres, este seria um gigante. Contudo, não foi o único membro da nobreza a ser descoberto com uma altura excepcionalmente elevada, o que conduziu a teorias de que as classes sociais mais elevadas seriam mais altas, provavelmente devido a melhor alimentação ou à ausência de trabalhos forçados, algo comum nas classes inferiores. O Sr.Chocolate também foi o responsável pela construção do templo II, que dedicou à sua esposa.


 A veia de empreendorismo deveria correr na família, porque o governante seguinte, e filho de ambos, ordenou a construção do templo IV, o mais alto, com cerca de 70m, que se ergue acima das copas das árvores, ao qual é possível subir e apreciar uma vista fenomenal sobre um mar interminável de verde, rasgado pelos outros 3 templos. É provavelmente o ponto alto da visita à cidade e, como tal, absolutamente imperdível.


Situado no norte da Guatemala, a cidade que serve de apoio ao parque é a ilha de Flores, localizada no lago Péten e que fica a cerca de 2h de viagem. É um local muito característico, que vale a pena visitar, bem como explorar o lago e as pequenas vilas nas suas margens.


Património da UNESCO desde 1979, Tikal é visitado por milhares de turistas anualmente, contudo ainda não é o turismo massificado que se observa em Chichén Itzá, ainda preserva a sua magia e misticismo na neblina que cobre a floresta. Talvez a minha opinião seja influenciada pelo fato de ser época baixa, e provavelmente não haver mais de 40 pessoas a visitar o parque ao mesmo tempo que eu, ou talvez se deva ao guia "privado" que me acompanhou a mim e à Maria, já que fomos as únicas a escolher castelhano como idioma da visita. Mas não deixa de ser um lugar único, sentimo-nos como os exploradores que reencontraram a cidade perdida, como que a roubar um segredo à floresta que nos envolve e que tão arduamente a tentou esconder.


sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Guatemala, o país de todas as cores



Guatemala não é um destino para todos. É preciso ter estômago para lidar com a pobreza, que como uma praga assola o país. É difícil ver as condições em que vivem as gentes, principalmente nas pequenas aldeias, por onde passei e me encheram o coração de tristeza. Tenho a imagem da pequena Maria, uma menina que conheci nas montanhas, em Semuc Champey, com 12 anos, mas que aparenta menos de 8, que não vai à escola e passa os dias a vender chocolates que faz com a mãe, aos hóspedes do hostel el portal, onde o pai trabalha. O maior sonho da Maria é seguir os passos do pai e um dia ser recepcionista do hostel, que é a sua casa, sendo os hóspedes os seus amigos.


Guatemala é perigoso, pelo menos de acordo com os comunicados e advertências assustadoras, que os países ocidentais dirigem aos cidadãos que lá pretendem fazer turismo. É um país de terceiro mundo, é certo, onde é preciso ter cuidados redobrados, como não mostrar grandes quantidades de dinheiro vivo, não usar jóias, ou roupas vistosas, nem usar aparelhos eletrónicos, nas zonas mais pobres, ou em Guatemala City, a capital, um lugar a evitar a não ser que não se tenha alternativa.


Mas penso que isso faz parte do senso comum, quando se viaja para um país, onde muita gente ainda não tem acesso a água canalizada ou eletricidade,  onde se podem fazer refeições por menos de 2€, onde, à excepção de Antigua, não existem hotéis de luxo, ou turismo que não seja o de mochila às costas.


Durante as minhas duas semanas no país não conheci senão curiosidade e amabilidade por parte dos Guatemaltecos. Nunca me senti insegura, nem quando estive quatro horas numa estrada bloqueada por manifestantes, agricultores de cardamomo, à espera que estes chegassem a um acordo com o governo sobre os preços praticados sobre a especiaria.




Senti-me em casa em Antigua, onde o Juan e a Amalia, um casal na casa dos 70, me acolheram. Senti-me protegida, quando fui cinco horas esmagada num chicken bus, no meio de operários que queriam saber tudo sobre o meu país, mas acima de tudo se estava a ser bem tratada no deles, com um orgulho indiscritivel no olhar, pelo facto de eu, uma gringuita que vem de um país longínquo, da rica, mas falida Europa, fazer uma viagem de tantas horas e tão cara para visitar a Guatemala.


É o país mais genuíno onde já estive. Onde as mulheres velhas ou novas ainda usam os seus trajes coloridos no dia a dia, onde vinte e um dialetos maia ainda são falados por 9 milhões de pessoas, principalmente nas montanhas onde conheci pessoas que não falavam espanhol.


Em Chichicastenango, se ignorarmos o mercado turístico, parece que paramos no tempo. À porta da igreja vê-se uma imagem que poderia ser observada provavelmente, há 50 ou há 100 anos atrás. Mulheres com os trajes típicos vendem flores ao longo da escadaria, envolvidas por uma nuvem de incenso que faz arder as narinas, espalhado por senhoras idosas que dizem, de joelhos, as suas ladainhas.


É o país de todas as cores. Desde as roupas, aos autocarros que já se tornaram o símbolo do país e ao pequeno quetzal, um pássaro de cores garridas, que deu o nome à moeda nacional.